23/05/2014

A menina que roubava livros, de Markus Zusak

A menina que roubava livros
Markus Zusak
Editora Intrínseca
480 páginas

"Ao perceber que a pequena ladra de livros lhe escapa, a Morte afeiçoa-se à menina e rastreia suas pegadas de 1939 a 1943. Assombrada por pesadelos, Liesel Meminger compensa o medo e a solidão das noites com a conivência do pai adotivo, um pintor de parede bonachão que lhe dá lições de leitura. Alfabetizada sob vistas grossas da madrasta, Liesel canaliza urgências para a literatura. Em tempos de livros incendiados, ela os furta, ou os lê na biblioteca do prefeito da cidade.
A vida ao redor é a pseudo-realidade criada em torno do culto a Hitler na Segunda Guerra.  A Morte, perplexa diante da violência humana, dá um tom leve e divertido à narrativa deste duro confronto entre a infância perdida e a crueldade do mundo adulto, um sucesso absoluto - e raro - de crítica e público."


Eu realmente não queria escrever esta resenha. É quando gostamos muito de um livro, gostamos muito mesmo, e aí temos medo de falar sobre ele. De que nossos sentimentos sejam um tanto quanto pequenos em relação à eles quando colocados em palavras. Eu acho, ainda, que esta resenha não será uma boa ideia.

Mas vamos às palavras:

É isto mesmo. O livro A menina que roubava livros trata das palavras. Cita-as várias vezes. Liesel Meminger, a personagens principal, uma menina da guerra, é apaixonada pelas palavras. E também as odeia. As palavras destroem, sussurra-se, e de novo e de novo. E também sabem salvar.

Também é sobre a guerra, a que se tornou a 2° Guerra Mundial, e que devastou tanto as pessoas que talvez nunca seja capaz de deixar de existir nas pessoas. Eu não estive lá (não nesta vida, pelo que sei), mas agora há um pouco dela em mim também. Os nazistas, os judeus, os alemães que são os nazistas e os judeus. Estes, que fazem parte da pátria, mesmo que esta os tenha repudiado. E há um novo olhar sobre a guerra. Todos os alemães apoiam a guerra? Ja oder nein? Nein. Liesel não apoiava a guerra. Ela tinha um amigo judeu, que era seu amigo por conta de promessas de outra guerra e um acordeão. E um endereço.

É a história dos livros, de cada um, junto de suas palavras impregnadas nas páginas. Quantos posso citar? O Assobiador, que me lembra vagamente dos vários livros de Agatha Christie. O Manual do Coveiro: o primeiro livro ninguém nunca esquece. E nem a neve, o trem, os olhos vazios.

Ah! Talvez eu devesse por as palavras antes, mas bem, aqui vão elas:
Esta resenha contém spoilers.

Mas talvez eles só sirvam para quem já começou a ler, ou para quem já está no comecinho da leitura.

É a história de Liesel. E Hans e Rosa. O quase atleta e adorável Rudy Steiner, Max Vandenberg, escritor e segundo melhor amigo de Liesel. Acho que o primeiro sempre será Rudy. Eu queria que fosse. E Frau Hotzapfel (que, notei singularmente, tem apfel escrito no nome. Apfel é maçã em alemão, mas o resto do sobrenome eu desconheço o significado), com, lá vai spoiler, seus filhos de guerra. Todos ali, naquelas páginas, são filhos da guerras. Seus corações nasceram dela, moldaram-se aos seus costumes e a ela se entregaram. Alguns. Os mais resistentes, porém, não se deixaram levar pela guerra. E a guerra os leva à morte.

Pois é. A morte. Dona Morte, como as dos quadrinhos. Não pensem, por favor, que estou "diminuindo" a Morte do livro de Liesel. Pelo contrário. Ela é tão humana, tão explicitamente humana, que o mais próximo que consigo chegar de um exemplo é a Dona Morte. Que aparecia nas historinhas, mas que nunca me deu medo. Como a Morte. Eu me compadecia por elas, criava um apreço pequeno, mas que estava lá. Consegui me aproximar um pouco mais da narradora de A menina que roubava livros, e ela foi a melhor personagem do livro todo.

Para não falar da escrita de Markus Zusak. Me lembrou, já quando estava avançando na leitura, da escrita de uma das minhas escritoras favoritas, Cornelia Funke. Poética, com notas suaves de palavras bonitas, mas que nunca, nunca deixam de ter um sentido autêntico. Quero dizer, nestas palavras, que cada letrinha que o autor deixou lá tem o seu papel no livro. Assim como as palavras dos livros de Liesel tinham importância para ela, cada uma das palavras de Markus Zusak ficou comigo, e talvez fiquem para sempre.

E... chorei. Quando quase todas as pessoas morreram. Acho que as pessoas certas ficaram para contar o resto da história, mesmo que, bem... Foi uma guerra. Pessoas certas também morrem. Não estou feliz com este pensamento, embora ele seja levemente reconfortante. Por algum motivo.

Li A menina que roubava livros no momento certo. Quando tinha lá meus doze anos, peguei uma vez na biblioteca para ler. Comecei, mas não fui nem até a metade. Durante a semana, enquanto estava lendo o livro rejeitado de pelo menos quatro anos atrás, percebo que não tinha maturidade para ler. Quero dizer, eu leria numa boa, mas nunca marcaria tanto quanto agora. Nunca faria tanto sentido as palavras de Markus, ou da Morte, ou de Liesel, para mim.

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